Micro e pequenas empresas sofrem na busca por investimentos, mas há possibilidade

A área da saúde reúne uma grande quantidade de startups, micro e pequenas empresas que criam projetos inovadores e encontram dificuldades na hora de obter apoio financeiro

Um dos assuntos levantados durante a última edição do CIMES (Congresso de Inovação em Materiais e Equipamentos para Saúde) foi a dificuldade das micro e pequenas empresas, incluindo as inúmeras startups da saúde, conquistarem apoio financeiro para dar andamento aos seus projetos de inovação. A falta de garantias de uma empresa recém-criada é um ponto de dificuldade visto, inclusive, por João Paulo Pieroni, chefe do Departamento do Complexo Industrial e de Serviços da Saúde do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). “A discussão de apoio à pequena empresa vai nessa direção de como encontrar uma solução para a falta de garantias. Temos que pensar em como ajudar a rede bancária”, comentou ele durante apresentação no congresso.

A visão do empresário é justamente essa: como conseguir comprovar o sucesso de um projeto que está iniciando para que ele mesmo funcione como fundo garantidor? “Cabe discutirmos uma constatação. No Brasil, tanto os bancos de desenvolvimento, como o BNDES e a FINEP, quanto os fundos de investimentos não querem correr riscos. Normalmente investem apenas em projetos de inovação que já estejam em um estágio de desenvolvimento bem avançado, permitindo a certeza do sucesso”, comenta Márcio Bosio, diretor institucional da ABIMO, sobre este entrave para a inovação. Com grande parte do risco econômico ficando sob responsabilidade dos empreendedores, o processo torna-se muito mais complexo (e as vezes inacessível).

Como alternativas às micro e pequenas empresas que se colocam a favor da cultura inovadora no país, Pieroni apresenta alguns cenários que se mostram interessantes. Uma primeira iniciativa por ele citada é o FGI – Fundo Garantidor de Investimentos. Tendo o BNDES como principal cotista, este fundo visa facilitar a obtenção de crédito por micro, pequenas e médias empresas incentivando-as, assim, ao crescimento e modernização.

Ciente de que essas companhias encontram dificuldades em atender as garantias exigidas pelas instituições financeiras, o FGI está disponível em bancos comerciais, públicos ou privados, para complementar as garantias oferecidas pelas empresas, aumentando as chances de aprovação dos pedidos de crédito e tornando-se uma alternativa real de suporte a quem vislumbra o desenvolvimento tecnológico. “Até recentemente, este fundo operava apenas para financiamentos menores garantindo 80% das operações de até R$ 1 milhão. Agora o fundo está aberto a operações de até R$ 3 milhões, o que foi uma grande mudança”, declara Pieroni sobre essa possibilidade que nem sempre é conhecida pelo empresariado.

Além do FGI, é interessante destacar a existência do Criatec, primeiro fundo de capital semente do Brasil que já está em sua terceira edição e desponta como opção para quem busca um sócio investidor. Destinado à aplicação em empresas emergentes inovadoras, tem como objetivo principal a obtenção de ganho de capital por meio de investimento de longo prazo em empresas que estão iniciando suas atividades e já nascem com perfil inovador. O projeto está direcionado a empresas brasileiras com alto potencial de crescimento e que desenvolvam tecnologias inovadoras para solução de problemas relevantes do mercado.

A proposta do Criatec está além do investimento, visto que o fundo participa ativamente da gestão das empresas, dando suporte estratégico e gerencial ao empreendedor, ajudando na seleção e formação da equipe, definindo metas e acompanhando os resultados. “O BNDES abre uma consulta pública e contrata um gestor que é quem, de fato, analisará e formatará as propostas para avaliação do banco”, explica Pieroni que enfatiza que em sua primeira edição, o Criatec ofertou 36 investimentos em oito estados brasileiros, sendo que desse montante onze eram na área de saúde humana, grande parte no setor de equipamentos médicos.

Com o passar dos anos, a participação do BNDES no Criatec foi reduzida. Se na primeira edição o banco respondia por 80%, na segunda passou a assinar 60% e, na terceira, 40%. Isso ocorreu devido ao sucesso da iniciativa que despertou o interesse de investidores privados. A cada edição, a lista de cotistas é modificada, bem como o gestor nacional do projeto.

A terceira edição já está acontecendo e conta com um total de R$ 220 milhões de capital comprometido, aportando valores que variam de R$ 1,5 a R$ 10 milhões por empresa. Para se candidatar, a empresa deve ter faturamento líquido de até R$ 12 milhões no ano anterior ao investimento e integrar os setores de tecnologia da informação e da comunicação, biotecnologia, agronegócio, novos materiais ou nanotecnologia.

“As empresas procuram desenvolver seus projetos com recursos próprios, o que é compreensível pelo excesso de informações e garantias exigidas na busca do crédito. Acredito que precisamos aprofundar essas experiências e aproximar os empreendedores destas possibilidades”, declara Bósio que enfatiza, também, o papel do governo neste setor de desenvolvimento: “é fundamental que o governo entenda que ele é o maior beneficiário da inovação em saúde, visto que esses novos dispositivos trazem ganhos aos pacientes, movimentam o setor de pesquisa e desenvolvimento do país, e geram inúmeros postos de trabalho e novos rendimentos em impostos”, finaliza.

Case de sucesso – A Magnamed é uma das empresas do setor de saúde apoiadas pelo Criatec. Nascida em São Paulo e associada da ABIMO, desenvolve soluções de ventilação pulmonar mais leves e portáteis capazes de atender, sem quaisquer trocas de dispositivos, pacientes neonatais, infantis e adultos. Vencedora do Prêmio Inova Saúde 2013, é um bom exemplo do tipo de investimento procurado pelo Criatec por reunir propriedade intelectual diferenciada, empreendedores comprometidos e soluções que entregam valor à sociedade.

Fundada em 2005, a empresa captou recursos junto à FINEP e à FAPESP em sua fase de incubação universitária no CIETEC-USP. Após três anos, já em 2008, a marca sairia em busca de novas formas de financiamento ou de estruturação de capital, como comenta o CEO Wataru Ueda. “Tivemos bastante ajuda desses mecanismos governamentais e, então, precisávamos de recursos para manter a fábrica, montar um sistema robusto de gestão e agregar pessoal para a fabricação e certificação dos produtos”, declara sobre o período em que se aproximou do Criatec, fundo que estava sendo iniciado na esfera pública.

Recentemente, além do suporto do Criatec, a empresa recebeu aporte da Vox Capital para seguir com seu desenvolvimento comercial e de pesquisa, mostrando que com organização e estratégia é possível encontrar bons investidores no segmento de saúde. Questionado sobre o melhor caminho para essa captação de recursos bem-sucedida, Ueda foca na importância da gestão: “é preciso ter um bom plano de negócios que aponte os fatores críticos de sucesso para, a partir daí, mostrar a solidez do projeto. Com isso, há quem queira apostar recursos”.

Como forma de alerta, Ueda destaca a importância de persistir durante a árdua fase que antecede a conquista das certificações necessárias no setor de saúde. “É uma fase realmente dura. Nós, na Magnamed, entre 2008 e 2010 sobrevivemos vendendo produtos que não necessitavam de autorização da Anvisa e isso foi fundamental para a nossa sobrevivência”, destacou frisando, mais uma vez, a importância de ter uma boa estratégia traçada. Hoje, com quase uma centena de funcionários, a Magnamed exporta para cerca de 30 países e é destaque no segmento em que atua.